MINISTÉRIO DOS DIREITOS HUMANOS

Silvio Almeida é questionado sobre visita da dama do tráfico, mas sessão é marcada por bate-bocas

Rhuan C. Soletti · 5 de Dezembro de 2023 às 18:35 ·

A sessão, contudo, foi marcada apenas por alfinetadas e bate-bocas, e o ministro não deu uma resposta satisfatória sobre o financiamento da visita da dama do tráfico em seu ministério

O ministro Silvio Almeida (Direitos Humanos) participou, nesta terça-feira (5), das comissões de Fiscalização e Controle e de Segurança Pública da Câmara dos Deputados para esclarecer a presença da dama do tráfico Luciane Barbosa Farias: ela foi recebida na no mês de maio pela coordenadora de gabinete da Secretaria Nacional de Promoção e Defesa dos Direitos Humanos.

Durante a reunião do colegiado, a resposta mal foi dada e a sessão foi marcada por bate-bocas e alfinetadas – sem melhores esclarecimentos. De qualquer modo, o Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania, sob a liderança de Silvio Almeida, chegou a confirmar o financiamento de uma das deslocações para Brasília. A viagem também incluiu a participação em uma reunião no Ministério da Justiça.

Conforme alegado pela pasta, o custeio da viagem foi feito após a indicação de Luciane como representante do Amazonas para o Encontro de Comitês e Mecanismos de Prevenção e Combate à Tortura, realizado na capital federal. A pasta argumenta que as despesas relacionadas aos comitês estaduais são de autonomia destes e que a instituição apenas atendeu à demanda, respeitando a autonomia administrativa e orçamentária dos colegiados.

Dos bate-bocas

O primeiro confronto foi com o deputado federal Kim Kataguiri (União-SP), que questionou o ministro sobre a participação da dama do tráfico, esposa de um líder de facção criminosa no Amazonas, em eventos governamentais. Em resposta, Almeida rotulou o congressista como representante da "extrema direita" e acusou-o de adotar um comportamento "usual fazer insinuações difamatórias".

Kataguiri rebateu, alegando que o ministro teve um "chilique". Em outros momentos, Almeida reagiu a uma pergunta feita por Eduardo Bolsonaro (PL-SP) sobre a declaração étnica do ministro da Justiça, Flávio Dino, e se sentiu ofendido com uma suposta associação feita por Marcos Pollon (PL-MS) entre sua atuação jurídica e facções criminosas.

"Eu já falei a respeito de todos os regramentos, de tudo que aconteceu [...] Agora, uma coisa que eu preciso dizer, eu já imaginava que o senhor não consideraria suficiente a minha resposta, porque da última vez que eu estive aqui, o senhor fez um vídeo para dizer que venceu o debate. Isso é tipicamente do grupo de extrema direita, isso é uma opinião política minha, e que tem algo usual fazer insinuações difamatórias, como o senhor faz agora ao meu respeito", disse.

A presidente das Comissões de Fiscalização Financeira e de Segurança, deputada Bia Kicis (PL-DF), interrompeu a fala do ministro, afirmando que o ministro não poderia usar o espaço para "discurso político". 

"Eu estou interrompendo como presidente da comissão, o senhor não está aqui para fazer discurso político. Eu sou a presidente dessa comissão, sou eu que conduzo. Eu estou interrompendo porque o senhor passou da sua resposta para ataque a grupo, a parlamentar e grupos políticos. O senhor é ministro do Brasil inteiro, é ministro de toda a população, direita, esquerda, centro. Estou interrompendo como presidente, é meu direito fazer isso, porque o senhor não pode atacar grupos políticos aqui dentro, isso aqui é um parlamento, uma casa plural, e não é o seu papel como ministro de estado, o senhor não é ministro de governo, atacar grupos políticos", respondeu Almeida.

Questionado por Eduardo Bolsonaro em relação à cor da pele de Dino, Almeida questionou sobre o porquê desta pergunta ser feita a ele – como se o teor da pergunta fosse racista. O filho do ex-presidente afirmou que Dino, indicado pelo presidente empossado Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ao Supremo Tribunal Federal (STF), se declarou branco em 2014, na eleição ao governo do Maranhão. Já em 2018, na reeleição, se declarou pardo; agora, negro.

Já com o deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG), o ministro foi questionado sobre alegadas arbitrariedades em seus posicionamentos relacionados à morte de brasileiros e sua postura em temas ideológicos. Em resposta, o ministro rotulou – de maneira padronizada pela esquerda – o parlamentar de "negacionista" em relação aos fatos, ao mesmo tempo em que mencionou uma suposta "hipocrisia" daqueles que, após a prisão de envolvidos nos eventos do 8 de Janeiro, passaram a advogar por melhorias no sistema prisional.

"Quem ouve o deputado falar parece até que ele gosta da verdade. É um negacionista que não se curva aos fatos. Se se curvasse aos fatos, saberia que nunca falei nada sobre esses espantalhos, sobre apropriação cultural, sobre brancos fazerem coisas", afirma. "Quando eu iniciei o projeto de olhar para as condições do sistema carcerário, o que me chamou a atenção foi que muitos dos senhores falaram que eu iria fazer rolezinho nas prisões. Agora, que estão sendo presos e condenados, se juntaram na luta por qualidade no sistema prisional. Eu chamaria isso de hipocrisia."

A dama do tráfico

Casada há 11 anos com o “criminoso número um” dos procurados da polícia amazonense, Luciane e seu marido – Clemilson dos Santos Farias, o Tio Patinhas – foram condenados em segunda instância por organização criminosa, lavagem de dinheiro e associação para o tráfico. De acordo com o Ministério Público, Clemilson adquiriu seu poder econômico em função do tráfico de drogas. O procurador Mário Ypiranga Monteiro Neto, em um trecho de sua denúncia em 2018, elencou que o criminoso costumava penalizar impiedosamente seus devedores, “ceifando-lhes a vida sempre que os crimes em que se envolvem lhes tornam credor”.

O MP do Amazonas classificou Luciene como o “braço financeiro” dos empreendimentos criminosos de seu marido. Segundo o departamento, ela exercia “papel fundamental também na ocultação de valores oriundos do narcotráfico, adquirindo veículos de luxo, imóveis e registrando ‘empresas laranjas’.” Seu ofício rendeu-lhe a “confiabilidade da cúpula da Organização Criminosa ‘Comando Vermelho’”. Em dezembro de 2012, o casal apresentou bens de R$ 30 mil na declaração de Imposto de Renda.

Enquanto Tio Patinhas cumpre 31 anos de detenção no presídio de Tefé (AM), sua esposa, condenada há dez anos, recorre em liberdade.

 


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