HOMENAGEM

Adeus, Away – Uma lágrima para um mestre do riso

Paulo Briguet · 5 de Dezembro de 2023 às 13:35 ·

Comediante Jaime Gil da Costa, o Brother Away, morre aos 66 anos. Você não aguentaria dez minutos de porrada com ele
 

Away, em inglês, quer dizer longe, distante, ausente. Nada pode ser mais oposto ao que o comediante Jaime Gil da Costa, mais conhecido como Gil Brother Away, representava para o seu público. Away morreu nesta segunda-feira, 3 de dezembro, aos 66 anos, no Rio de Janeiro. Para nós, da geração que o acompanhou no programa Hermes & Renato na MTV dos anos 2000, e depois em seus canais humorísticos na internet, Away sempre estará muito próximo. É bem verdade que ele nos chamava de badernistas, dizia que fomos todos criados a leite de pera e ovomaltino, além de garantir que nenhum de nós aguentaria dez minuto de porrada com ele.

Gil nasceu em Petrópolis, em 1957, filho de um ferroviário e de uma dona de casa. Depois da separação dos pais, aos 8 anos de idade, Gil começou vender doces no semáforo ajudar a mãe no sustento da casa. Aos 11 anos, como flanelinha e lavador de carros, tornando-se uma figura conhecida na Rua Irmãos D’Angelo, no centro da cidade serrana. Quando juntou um dinheirinho, comprou um rádio, que passou a ser o seu principal instrumento de trabalho: ao som do funk e do soul, Gil passou a receber suas gorjetas por seus números de dança na rua. Logo estava sendo convidado para apresentar-se nos bailes da região. Mas nem sempre era fácil para o nosso herói: algumas vezes ele apanhou da polícia.

No final de uma apresentação, alguém gritou para o dançarino:

— Aí, Brother Away!

O apelido pegou. Em 2002, o dançarino das ruas chamou a atenção dos integrantes do grupo Hermes & Renato, cujos pais conheciam Gil desde a infância. Chamaram Gil para atuar nos quadros do programa da MTV. A parceria durou seis anos e foi inesquecível — sobretudo para nós, bando de garotinho juvenil criado a leite moça.

(Aqui vale um parêntese. Justamente em 2002, com a primeira eleição de Lula, começava a derrocada do humor brasileiro, depois do período glorioso de Chico Anysio, Jô Soares, Agildo Ribeiro e da meteórica ascensão da turma do Casseta & Planeta a partir dos anos 80. Eleito Lula, o humor brasileiro começou a ficar chato, sem graça, chapa-branca. Graças a Deus, havia Hermes & Renato, com seu humor punk e nonsense, para dar algum alento à comédia tupiniquim.)

Away era uma espécie de coringa do Hermes & Renato. Era sempre o mesmo, mas se apresentava com as mais diversas e díspares identidades: mendigo, professor de direito, jornalista, empresário, cozinheiro, atleta, músico, dançarino, santo, presidiário. E se alguém viesse reclamar de alguma coisa, a resposta vinha na lata:

— Bota uma dentadura no cu e ri pro caralho!

Há um quadro inesquecível (que você pode assistir abaixo) sobre a vida e a obra de Dedé da Silva Carvoeiro — uma personagem que só poderia ser encarnada pelo Away. Nascido em Capinganhões, no sertão nordestino, esse macunaíma saiu de casa aos 3 anos e aos 9 já criava a bossa nova e compunha “Garota de Ipanema”, música que deu de presente ao seu amigo Tom Jobim. Cansado da música, tornou-se atacante do Flamengo e acabou sendo artilheiro da Copa do Mundo de 1972. Sofreu uma lesão e passou três anos internado em um hospital, mas não perdeu tempo: escreveu cinco livros e fundou a Academia Brasileira de Letras. Depois de conquistar o campeonato mundial de fisiculturismo, morreu tragicamente atropelado, não sem antes pronunciar as palavras históricas: “Te amo, Brasil!” Seu enterro foi acompanhado por milhões de fãs e ele se tornou o primeiro santo brasileiro: São Dedé Carvoeiro.

O humor brasileiro nunca mais será o mesmo depois você, Away. Te amamos.
 

 

 


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