DIÁRIO DE UM CRONISTA

Abraço fatal – A segunda morte de Sergio Moro

Paulo Briguet · 14 de Dezembro de 2023 às 15:49 ·

A cena dos dois ex-juízes abraçados é a síntese perfeita do teatro que os donos do poder insistem em chamar de democracia

Ao congratular-se diante das câmeras com Flávio Dino na sabatina desta quarta-feira, Sergio Moro teve a sua segunda e talvez definitiva morte moral. O abraço entre Dino e Moro é uma imagem perfeita do que os donos do poder têm como modelo ideal da política brasileira: um teatro de democracia em que os protagonistas fingem ser adversários, enquanto o povo finge que acredita nas eleições.

 A primeira morte moral de Sergio Moro foi a sua saída do governo Bolsonaro em 2020, durante a pandemia. Nunca me esquecerei das primeiras palavras de Moro durante a entrevista coletiva em que anunciou sua renúncia: foram um elogio ao PT. Moro tentou implodir o governo que lhe acolheu com base numa narrativa fantasiosa de que a gravação de uma reunião ministerial conteria escândalos que abalariam a República – quando na verdade a gravação só continha a prova de que Bolsonaro era exatamente o mesmo em público ou em encontros fechados. Só a arrogância de quem se considerava um herói nacional acima de qualquer medida (como Brás Oscar mostrou nesta deliciosa crônica) e o desconhecimento do mundo real podem explicar a palhaçada de Moro, para quem, na época, escrevi uma Oração Fúnebre.  

Nas eleições de 2022, depois de ver seu sonho presidencial desfeito pela realidade, Moro candidatou-se a senador pelo Paraná – e só conseguiu se eleger com o fundamental apoio de uma pesquisa eleitoral vagabunda que o colocava como única opção para evitar um novo e fatídico mandato de Alvaro Dias. Abertas as urnas, verificou-se que o candidato do PL ao Senado, Paulo Eduardo Martins, obteve uma votação muito acima do que a tal pesquisa mostrava. Para se eleger em um estado conservador como o Paraná, Moro teve que fazer as pazes com o eleitorado bolsonarista. O abraço de ontem representa uma traição a esses eleitores. Curiosamente, foi Alvaro Dias o grande responsável pela aprovação do nome de Edson Fachin em 2015. Agora, foi a vez de Moro dar as costas a quem o elegeu, ajudando a empurrar o rotundo comunista para a Suprema Corte. Imaginem vocês, meus sete leitores, o que Paulo Martins não seria capaz de fazer em um confronto com Dino!

O motivo mais provável do abraço é a existência de um acordo entre Moro e o atual regime; Moro sinaliza o voto em Dino, enquanto o regime deixaria de insistir na cassação do mandato de Moro. No entanto, Moro se esquece de que há um problema incontornável em fazer acordo com comunistas: eles jamais cumprem o acordo. Bolsonaro aprendeu isso da pior forma em 8 de setembro de 2021, quando fez o famoso acordo de pacificação mediado por Michel Temer.

Como eu nunca me canso de dizer, esquerdistas não perdoam. Para todo o sempre, Moro será o homem que prendeu Lula e aceitou participar do governo Bolsonaro. Lula e seus asseclas não descansarão enquanto não enxergarem o cadáver de seus adversários, um a um.

Ontem lembrei-me de um dos ídolos de Flávio Dino: Mao Tsé-tung. Notaram como o comunista maranhense mostrou-se suave e pacífico durante a sabatina? Pois o genocida chinês fez algo parecido em 1956, durante o chamado “Desabrochar das Cem Flores”. Nesse período, Mao encorajou intelectuais, políticos e cidadãos comuns para que fizessem críticas ao modelo comunista. Anotados cuidadosamente os nomes dos críticos, todos foram perseguidos, aprisionados ou mortos nos anos seguintes. Os sorrisos e abraços de Dino precedem uma perseguição sem precedentes aos adversários do regime.

Aquele foi um abraço de morte, Moro. E ninguém vai chorar por você.

Paulo Briguet é escritor e editor-chefe do BSM.

 


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