Moraes deve ser responsabilizado pela morte de Cleriston, diz desembargador
Preso por estar no lugar errado e na hora errada, o empresário morreu pelo mesmo motivo. Há 80 dias, ele deveria estar em casa, com sua esposa e suas filhas. Mas Moraes não permitiu
Um desembargador aposentado do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, Sebastião Coelho, que atua como advogado de um dos réus detidos em decorrência das manifestações ocorridas em 8 de janeiro, atribuiu ao ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), a responsabilidade pela morte de Cleriston da Cunha.
Cleriston, conhecido como Clezão, faleceu na segunda-feira (20) enquanto estava sob custódia na Penitenciária da Papuda, no Distrito Federal.
Para Coelho, a morte de Clezão não pode ser dissociada dessas autoridades, tornando imperativa a responsabilização de outros membros do Supremo Tribunal Federal, bem como do presidente do Senado, pelo desfecho trágico do caso. O advogado e ex-desembargador expressou suas preocupações em relação à situação do detento, enfatizando a necessidade de investigação e prestação de contas por parte das autoridades envolvidas.
Em uma publicação em seu perfil no Instagram, Coelho declarou: "Alexandre de Moraes é o principal responsável pela morte de Cleriston, hoje, na Papuda". O desembargador aposentado não se limitou a apontar exclusivamente o magistrado como culpado pela tragédia, destacando que outros membros do STF e até o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), devem prestar esclarecimentos diante da situação envolvendo o homem detido desde o início do ano.
"Até quando vamos ficar assistindo a essas barbaridades? Chegamos ao limite. Não dá mais. Providências têm que ser tomadas imediatamente", Coelho indaga.
Ele enfatiza a omissão de Pacheco no tratamento dos presos ligados aos protestos de 8 de janeiro. Para o desembargador, o presidente do Senado deve agir de forma proativa, buscando o afastamento de Moraes do Supremo Tribunal Federal (STF).
No mesmo contexto, o desembargador aposentado e atual advogado destaca a necessidade de ação por parte dos senadores e demais ministros do STF. Expressando suas preocupações em um vídeo no qual critica Moraes e expressa condolências à família de Clezão, Coelho ressalta a importância de medidas concretas.
Ele aponta que o Ministério Público deve desempenhar um papel crucial, inclusive no âmbito criminal: "A Procuradoria da República tem que atuar para responsabilizar criminalmente Alexandre de Moraes."
Cleriston Pereira da Cunha, 46 anos, empresário, casado, pai de duas filhas, natural de Feira da Mata (BA), residente há mais de 20 anos em Brasília, conhecido como “Clezão”, é a primeira vítima fatal da ditadura democrática instaurada pelo STF desde os acontecimentos de 8 de janeiro. Ele morreu na manhã de hoje, após o banho do sol no Presídio da Papuda, quando sofreu uma convulsão seguida de parada cardiorrespiratória.
O médico e preso político Frederico Rosário Fusco, conhecido por ajudar os companheiros do cárcere, tentou dar o primeiro atendimento a Cleriston, mas não conseguiu reanimá-lo. Segundo os primeiros relatos, houve demora na transferência do preso para um hospital. Sua morte foi confirmada no início da tarde.
Em 27 de fevereiro de 2023, a médica Tania Maria Liete Antunes de Oliveira, da Hospital Regional de Taguatinga, emitiu o seguinte relatório médico sobre o paciente Cleriston Pereira da Cunha:
“Paciente de 45 anos acompanhado na reumatologia há cerca de 8 meses por quadro de vasculite, de múltiplos vasos e miosite secundária à COVID-19, permaneceu internado em 2022 por 33 dias, submetido a pulsoterapia de corticoide e antibioticoterapia.
Após alta hospitalar, está em uso das seguintes medicações:
Prednizona em desmame. Atualmente, 5 mg por dia
Fluxotina 20 mg, dia devido a síndrome vasovagal secundária a vasculite
Propranolol 20 mg, de 12 em 12 horas.
Azatioprina 100 mg por dia.
Em função da gravidade do quadro clínico, há risco de morte é pela imunossupressão e infecções. Solicitamos agilidade na resolução do processo legal do paciente, até pelo risco de nova infecção por COVID, que pode agravar o estado clínico do paciente. Possuía consulta no ambulatório de reumatologia do hospital regional de Taguatinga, agendado para 30/01/2023, às 13h, mas não compareceu devido ao impedimento legal, não compareceu à consulta do dia 27/02/2023 devido à mesma situação. Necessita manter o acompanhamento médico contínuo e uso das medicações prescritas de forma correta.”
Desde 1º de setembro, havia um parecer da Procuradoria-Geral da República (PGR) favorável à soltura do preso, em razão de seu delicado estado de saúde. No parecer, o subprocurador Carlos Frederico dos Santos afirmou que “não se justifica a segregação cautelar, seja para a garantia da ordem pública, seja para conveniência da instrução criminal, especialmente considerando a ausência de risco de interferência na coleta de provas”. Mesmo assim, não o ministro Alexandre de Moraes não se manifestou.
Segundo relatos de pessoas que o conheceram na Papuda, Clezão era uma figura benquista entre os companheiros de infortúnio. Seu estado de saúde inspirava cuidados há muitos meses. Ele já havia sido transferido para um hospital durante alguns dias e queixava-se constantemente de dores no peito.
“O estado de saúde de Cleriston já havia motivado o parecer da PGR. Estamos diante de um caso claro de abuso de autoridade, que resultou em morte”, diz o advogado Cláudio Caivano, autor do livro 08.01 – A História Não Contada. “Houve um ato criminoso, ainda que culposo. É um caso que deve ser apurado com rigor.”
Cleriston foi preso em 8 de janeiro quando se refugiou em um prédio da Praça dos Três Poderes para se proteger das bombas de gás lacrimogêneo e dos tiros com bala de borracha. Preso por estar no lugar errado e na hora errada, o empresário morreu pelo mesmo motivo. Há 80 dias, ele deveria estar em casa, com sua esposa e suas filhas.
Mas Moraes não permitiu.
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