ESPECIAL

Ludmila Lins Grilo revela que se exilou nos EUA por perseguição política

Paulo Briguet · 3 de Janeiro de 2024 às 02:03 ·

Por meio de suas redes sociais, professora e jurista confirma que deixou o Brasil logo após a vitória eleitoral da aliança PT-STF. Conselho Nacional de Justiça e Tribunal de Minas Gerais ignoraram ameaças recebidas pela juíza e decidiram puni-la por suas opiniões

A professora e jurista Ludmila Lins Grilo, juíza afastada de seu cargo pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) há 11 meses, está exilada nos Estados Unidos desde novembro de 2022 (quando ainda era juíza em plena atividade). Ludmila fez a revelação sobre seu exílio hoje (3 de janeiro) por meio de seu perfil na rede social Locals. Ainda nesta quarta-feira, numa live transmitida pelo YouTube, ela vai falar sobre a perseguição política que vem sofrendo pelos integrantes da cúpula do Judiciário. A perseguição motivou sua decisão de exilar-se logo após o segundo turno das eleições presidenciais e a vitória do atual ocupante da Presidência, Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Ludmila Lins Grilo resolveu deixar o Brasil por avaliar que os abusos do STF e do CNJ assemelham-se às aberrações jurídicas praticadas por regimes totalitários comunistas, tais como a ditadura da antiga União Soviética e os governos revolucionários de inspiração socialista na América Latina. Segundo a professora, as decisões da atual cúpula do Judiciário fazem lembrar as atrocidades jurídicas cometidas na Rússia soviética a partir de 1917, com a instauração da Tcheka (polícia secreta comunista, precursora da KGB e da atual FSB), a atuação dos Tribunais Revolucionários e a publicação do famigerado Artigo 58 do Código Penal Soviético, que estabelecia punição para supostos crimes contrarrevolucionários. “Substitua-se a palavra contrarrevolucionários por antidemocráticos e teremos a exata percepção do que está acontecendo hoje, com a implantação de uma ditadura por meio da cúpula do Poder Judiciário”, diz Ludmila.

Ao revelar a sua condição de exilada, Ludmila desmonta os pretextos utilizados pelo CNJ para afastá-la em fevereiro de 2023, numa sessão em que o papel do relator/acusador coube ao ministro Luis Felipe Salomão, do Superior Tribunal de Justiça (STJ). As principais acusações contra Ludmila foram as de ter publicado manifestações de cunho político nas redes sociais e ter sido negligente com seus deveres funcionais na Comarca de Unaí, em Minas Gerais. O suposto descumprimento de deveres funcionais se deveria ao fato de que Ludmila não compareceu presencialmente ao Fórum da cidade. Como o andamento dos processos sob sua responsabilidade seguia normalmente, restava aos acusadores questionar a sua ausência física da comarca.

Três meses depois do afastamento de Ludmila pelo CNJ, os desembargadores do Tribunal de Justiça de Minas Gerais decidiram aposentá-la compulsoriamente. Os motivos alegados para a decisão foram três: um tweet em que Ludmila criticou a audiência de custódia, um dos “clássicos” da bandidolatria brasileira; uma palestra sobre ativismo judicial que a magistrada fez a convite da Fundação Alexandre de Gusmão (Funag); e uma discussão que Ludmila travou com comentaristas de suas redes sociais.

Em 2022, os desembargadores do TJMG tomaram uma decisão que colocou a vida da juíza em sério risco. Ludmila começou a ser vítima de ameaças e mensagens de stalkers — um deles preso por ameaça e extorsão contra a juíza, conforme o BSM noticiou. Preocupada com essas ameaças Ludmila solicitou um parecer sobre seu caso ao Centro de Segurança Institucional — Assessoria Militar do TJMG. No relatório sobre o caso, concluído em 12 de agosto de 2022, o órgão interno do tribunal chega a várias conclusões extremamente preocupantes sobre quatro stalkers que ameaçavam Ludmila. Seguem alguns trechos do relatório:

“É crível prospectar que haja motivação suficiente para a prática de um ato hostil [contra a juíza], quando houver oportunidade para tanto.”

“Este indivíduo [stalker] encontra-se sem monitaração eletrônica desde 2.jun.2022.”

“O padrão das mensagens de áudio enviadas por este perfil possui de forma recorrente conteúdo sexual e apelativo.”

“O dono de um dos perfis investigados responde processo criminal por tentativa de homicídio tendo c0mo pano de fundo uma investigação por assédio sexual a uma adolescente de 13 anos.”

“O indivíduo é investigado por porte de arma ilegal.”

“O indivíduo apresenta traços que deixam em xeque a sua sanidade mental.”

“O autor das mensagens perseguiu outras pessoas mesmo depois de ser preso. (...) Quando se avalia o histórico em transladar das questões virtuais para as reais, este indivíduo assume condição de expoência perante os demais, não sendo o fator distância nem mesmo a ação policial que já o levou à prisão obstáculo ao seu intuito de se aproximação do alvo previamente escolhido por meio da rede social com o objetivo de realizar ataques.”

“São contraindicadas quaisquer ações que evidenciem a localização imediata e posterior da vítima que está sob vigilância e ação de stalkers.”

“O risco é extremo, pois a indicação de presença [da vítima] em qualquer local, ainda que de maneira remota, funciona como meio de monitoração e elaboração de planos que visem à realização de atentados.”

Como se vê, o Centro de Segurança do TJ concluiu expressamente que a magistrada deveria evitar a repetição dos mesmos lugares em sua rotina de trabalho. Com base nessa análise de cenário, Ludmila adotou o trabalho por videoconferência, evitando idas ao Fórum do Unaí e permanência em locais já conhecidos pelos stalkers (ao menos um deles já possuía o seu endereço residencial). Por sua vez, os desembargadores ignoraram os alertas da assessoria de segurança e se recusaram a aceitar as recomendações, colocando em risco a vida de Ludmila. A submissão dos magistrados do TJ ao Sovietão de Brasília chegou ao extremo de expor uma mulher à sanha de facínoras.

Para manter as aparências de que se preocupavam com a integridade da juíza, os desembargadores ofereceram-lhe uma escolta. “Só que eu já fui escoltada e sei como é”, diz Ludmila. “Você fica em casa sozinha e o policial vai dormir no hotel. No dia seguinte, ele está em sua porta para te acompanhar ao fórum e fica na porta do seu gabinete, como se isso evitasse alguém de invadir meu apartamento de madrugada.”

No fundo, os acusadores do CNJ e do TJMG queriam só o silêncio de Ludmila. Como não o obtiveram, decidiram arrumar uma desculpa para castigá-la. Tentaram ocultar suas intenções maculando a imagem de Ludmila como servidora pública. Ludmila suportou calada os ataques do Sovietão judiciário – e o sarcasmo da roda de escarnecedores esquerdistas nas redes sociais. Agora, tudo se revela: a mulher que as claques esquerdistas xingaram e lincharam no tribunal da internet era, na verdade, a vítima de uma ditadura. As sessões que condenaram Ludmila não foram julgamentos – foram expurgos. Com a revelação feita hoje, Ludmila adota um expediente socrático, ao inverter a sentença de seus acusadores.

Ao optar pelo exílio nos Estados Unidos, Ludmila evitou sofrer o mesmo destino de pessoas cujas histórias ela conheceu ao estudar regimes totalitários, como por exemplo a juíza venezuelana María Lourdes Afiuni. Em 2009, María Lourdes foi presa por ter contrariado as ordens do ditador Hugo Chávez. O crime da magistrada foi ter libertado um homem que ficou preso por três anos, sem julgamento e sem direito à defesa. Na prisão, a juíza foi colocada em celas com criminosas que ela havia condenado. Foi violentada, torturada e estuprada por agentes do regime. Como consequência dos maus-tratos na prisão, María Lourdes perdeu o útero, precisou reconstruir cirurgicamente o ânus e a vagina, teve uma lesão na mama direita e sofre até hoje com problemas psicológicos crônicos. Quem conhece e estudou a história dos regimes totalitários do século XX sabe que esse é um destino não apenas verossímil, mas provável para os inimigos dos comunistas, especialmente para aqueles capazes de influenciar as pessoas pela via intelectual – como foi o caso de Aleksandr Soljenítsin, Karl Kraus, Olavo de Carvalho e de dissidentes atuais como Allan dos Santos e Ludmila Lins Grilo. O único tipo de intelectual aceito pela extrema-esquerda é aquele que se submete às mentiras do regime. Todos os outros são perseguidos, calados e, muitas vezes, destruídos.

Lembro-me claramente de uma palestra de Ludmila durante um congresso conservador em Florianópolis, há três anos. Ironicamente, o evento cultural – cujo tema era O Preço da Liberdade –, acabou sendo considerado pelo CNJ como um “desvio funcional” da magistrada.

Logo no início de sua palestra em Florianópolis, ela fez uma indagação ao público, com aquele seu sotaque carioca inconfundível:

— Por favor, levante a mão quem acredita que o juiz de direito ganha bem no Brasil.

Todos levantaram a mão.

Em seguida, ela perguntou:

— Então, para vocês é razoável que o juiz se abstenha de dar opiniões sobre assuntos importantes?

Quase todos levantaram a mão — com pouquíssimas exceções, entre elas o grande Paulo Kogos e este cronista de sete leitores.

Naquele dia, Ludmila fez a apologia de algo fundamental: o direito de dizer a verdade em qualquer circunstância. Uma liberdade cuja importância nem a autoproclamada direita conservadora consegue entender plenamente. Quando estão em risco os direitos sagrados – aqueles que nenhum homem criou, mas o próprio Deus – não há nada no mundo que justifique a omissão, o silêncio, a censura. Vale lembrar as palavras de Antígona, personagem da tragédia imortal de Sófocles. Diante de uma decisão injusta do tirano Creonte, que a impede de sepultar o próprio irmão, Antígona diz as palavras aladas:


Não considero que tu, mero homem mortal,
Possa com uma palavra anular ou substituir
As leis imutáveis não-escritas do Céu.
Elas não nasceram ontem;
Elas não morrem; e ninguém sabe de onde vieram.


Ludmila é a nossa Antígona nessa Tebas de opressão e silêncio em que pretendem transformar o Brasil. O seu exílio é também o nosso exílio. Não foi o acaso que a levou a fazer aquela palestra em Florianópolis, a Ilha do Desterro. E também não deve ter sido a mera coincidência que a levou a escolher, para o dia da revelação de seu exílio, esse período do ano em que lembramos a história daquela pobre família obrigada a se refugiar em outro país para escapar das garras de um governante insano. Por isso, nada melhor do que encerrarmos esse texto com a oração da Mulher que um dia se exilou:


Ó Nossa Senhora do Desterro, Mãe amorosa que fugiu com seu amado Filho para salvar a vida dele, ouça o meu pedido. Proteja-me em tempos de angústia e incerteza, seja meu refúgio quando pareço perder o chão sob meus pés. Guie-me de volta ao conforto do lar ou ajude-me a encontrar um novo lar, um novo começo. Interceda por mim e por todos que se encontram desterrados para que encontremos paz e esperança em seu amparo maternal. Amém.


Paulo Briguet é escritor e editor-chefe do BSM.

 


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