LIBERDADE

O mundo precisa saber como o Estado brasileiro vem cerceando direitos fundamentais

Especial para o BSM · 11 de Abril de 2024 às 17:19 ·

Jurista e escritor Augusto Zimmermann escreve: "É como se os membros da Suprema Corte como se estivessem dizendo que, diante de supostas ‘grandes ameaças’, a Constituição brasileira não importasse mais"

Por Augusto Zimmermann

A situação que o Brasil está vivenciando se torna mais clara a cada dia.

Desde o estabelecimento de um regime autoritário de fato, em janeiro de 2022, inúmeras inconstitucionalidades, ilegalidades e abusos de poder foram cometidos contra o ex-presidente Jair Bolsonaro e seus apoiadores.

Para ser justo, a administração do Sr. Bolsonaro foi marcada por uma série de boicotes e interferências—especialmente por juízes federais de alto escalão que se colocaram para resolver questões de natureza administrativa/executiva, dificultando assim decisões presidenciais legítimas.

A história é longa e não pode ser resumida aqui, mas envolve inúmeras ilegalidades e injustiças cometidas contra várias pessoas que trabalharam ou apoiaram o Sr. Bolsonaro.

Para contextualizar os fatos a serem expostos neste artigo, deve-se mencionar que, em 2019, por iniciativa do então Presidente do Supremo Tribunal Federal, foi aberta a investigação número 4.781.

Na época, o argumento era investigar supostos “crimes contra a honra” cometidos contra os próprios juízes daquele tribunal.

Uma enorme controvérsia jurídica cercou o caso, porque era muito claro para qualquer um, mesmo sem qualquer formação em direito, que juízes não podem presidir investigações criminais como se fossem chefes de polícia.

Além disso, cabe ao Ministério Público propor a denúncia e, por último, mas não menos importante, a alegada vítima do ato não pode ser o próprio juiz do caso que trata do mesmo ato alegado.

Em resumo, as peculiaridades jurídicas desta investigação são tantas que seria necessário centenas de páginas para enumerá-las.

Enquanto isso, a surreal investigação foi iniciada, apesar de tantos vícios em sua origem. O escolhido para relatar foi o Ministro Alexandre de Moraes.

 

Investigação inacreditável

Em 15 de abril de 2019, o então Procurador-Geral da República, André Mendonça, que naturalmente era responsável pela acusação, decidiu em 15 de abril de 2019 que tal investigação deveria ser arquivada.

Ele declarou explicitamente: “O sistema acusatório penal não autoriza que a condução da investigação criminal seja realizada pelo Judiciário, notadamente quando exclui o titular da ação penal, ou quando lhe impõe sigilo na condução da investigação. Tais medidas violam o Artigo 129-I, II, VII, VIII, e parágrafo 2º da Constituição”.

Em 2020, com esta investigação malfadada em pleno andamento, o partido de esquerda REDE também solicitou que fosse arquivada.

O tribunal então decidiu, por 10 votos a um, continuar a investigação. O motivo, inscrito no resumo, foi a suposta gravidade da ameaça aos membros do Supremo Tribunal.

Em outras palavras, incrivelmente, era como se estivessem dizendo que, diante de supostas “grandes ameaças”, a Constituição brasileira não importaria mais.

Para o então Presidente do Supremo Tribunal Celso de Melo, a investigação teria “o objetivo legítimo de permitir a defesa institucional do Supremo Tribunal, protegendo a honorabilidade deste alto Tribunal e preservando a integridade física e moral dos juízes que dele fazem parte”.

Houve um aviso do veterano Ministro do Supremo Tribunal Marco Aurélio Mello, cujo argumento foi completamente ignorado.

Em suas palavras na época: “Estamos diante de um inquérito natimorto, e diante dos anedotas [ouvidas] verificadas após a sua instauração, eu diria até uma investigação de fim de mundo, sem limites”.

Assim, tão inacreditável quanto isso possa parecer, esta investigação continua aberta até hoje. Mesmo após cinco anos, o prazo legal para a conclusão deste tipo de procedimento no Brasil é na verdade de 30 dias, e pode ser prorrogado apenas excepcionalmente.

Atualmente, pessoas que ousaram criticar publicamente o Tribunal, as urnas eletrônicas, algumas vacinas COVID-19, ou sugerir certos tipos de tratamento COVID-19, são objeto de investigação sob este procedimento extraordinário.

A primeira dessas investigações se desdobrou em pelo menos duas: a Investigação 4921, que investiga atos de vandalismo ocorridos em Brasília na véspera da posse do presidente Luís Inácio Lula da Silva; e outra que está investigando uma suposta tentativa de golpe por parte do ex-presidente Jair Bolsonaro.

Para contornar a crítica de que um juiz não deve agir por iniciativa própria, o Ministro Moraes possui uma equipe de chefes de polícia que foram acomodados em seu gabinete, prontos para fazer pedidos de medidas cautelares, que são concedidas (e nunca rejeitadas) imediatamente, em decisões com dezenas de páginas.

O Ministro Moraes é o relator dessas investigações porque, segundo o Tribunal, todas elas tratam de “crimes relacionados”—desde recomendar o uso de hidroxicloroquina para tratar a COVID-19, até planejar um “golpe de Estado”!

 

Premissa falsa

Outro capítulo da arbitrariedade judicial praticada é o caso do ex-assessor internacional Filipe Martins, perseguido pela Polícia Federal e pelo Supremo Tribunal Federal.

Ele foi assessor internacional do Sr. Bolsonaro e sua prisão — por supostamente ser um fugitivo nos Estados Unidos— é resultado de uma operação da Polícia Federal que investiga supostos “ataques contra o Estado de Direito democrático no Brasil”.

Mas “fugitivo” de quê, se ele não foi acusado? “Fugitivo” como, se foi encontrado residindo com sua noiva e vivendo no Brasil?

Além de infundadas, as alegações trazem evidências falhas, como um relatório “equivocado” da Polícia Federal alegando que o Sr. Martins deixou o Brasil para “fugir” ou para “propósitos obscuros”, embora seus advogados já tenham provado que ele não esteve ausente do Brasil desde dezembro de 2022.

Em resumo, sua privação de liberdade é fundamentada em uma premissa totalmente falsa.

O que está acontecendo no Brasil é extremamente grave. Há uma supressão contínua de direitos constitucionais, bem como um completo desrespeito aos princípios de justiça natural e devido processo legal.

Como consequência, os acusados e seus advogados de defesa simplesmente não têm acesso ao conteúdo completo ou natureza das acusações, bem como aos elementos “probatórios” que compõem os registros.

O que estamos testemunhando, portanto, são uma série de procedimentos sem sentido que fazem a obra de Franz Kafka parecer o ensaio desajeitado de um estudante do ensino médio.

Deve-se repetir que as investigações presididas pelo Ministro Moraes continuam sem prazo para acabar, sem que os advogados tenham acesso total a elas, sem controle externo, e com o consentimento do Ministério Público.

Pode-se inferir, dado tudo o que pode ser testemunhado, que o principal objetivo é efetuar a prisão do Sr. Bolsonaro, por ter “desacreditado” o sistema eleitoral, ou por expor fatos sobre as vacinas COVID-19, ou por supostamente encorajar atos de vandalismo em 8 de janeiro de 2023, em Brasília (o Sr. Bolsonaro estava nos Estados Unidos), ou por ter considerado “realizar um golpe de Estado,” ou por qualquer outro motivo que possam decidir atribuir a ele aleatoriamente, à conveniência de seus detratores e inimigos políticos.

Para concluir, a grosseira injustiça contra o Sr. Martins deve cessar, assim como todas as arbitrariedades e abusos de poder judicial que hoje pesam sobre milhões e milhões de brasileiros, que não estão fazendo nada além de defender sua consciência e seus direitos constitucionais à liberdade de comunicação política e à liberdade de escolha.

(Publicado originalmente em The Epoch Times.)

Augusto Zimmermann, nascido no Brasil, é professor e chefe de Direito no Sheridan Institute of Higher Education. Ele é ex-reitor associado de pesquisa da Murdoch Law School. Durante seu tempo em Murdoch, o Dr. Zimmermann recebeu o Prêmio de Vice-Chanceler da Universidade por Excelência em Pesquisa em 2012. Ele também é ex-comissário da Comissão de Reforma Legislativa da Austrália Ocidental (2012-2017). Dr. Zimmermann é autor/coautor de vários artigos acadêmicos e livros, incluindo 'Foundations of the Australian Legal System: History, Theory and Practice' (LexisNexis, 2023), 'The Unlucky Country' (Locke Press, 2024), e Direito Constitucional Brasileiro (Lumen Juris, 2014).

 


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