A heróica democracia dos generais da imprensa
Estreando em 2024, o Motorista do Uber analisa com humor (e alguma boa vontade) as manchetes que denunciam a falência da mídia e o circo do jornalismo nacional.
Com os anos em festa, 2024 entrou rasgando e eu nem percebi como o passar do tempo é rápido embora a grana seja sempre curta.
Curtindo a virada loucamente com a equipe do BSM, eu acabei fazendo de tudo, e levando muita coisa nas costas para que o regozijo fosse total e ninguém ficasse sobrecarregado. Afinal, mais do que um motorista, eu sou um grande pau pra toda obra.
Foi assim, entre idas e vindas, que minha coluna ficou mais abandonada que cachorro sem dono.
Mas isso vai mudar!
Com o salário de julho de 2023 em análise, o Grimaldo me prometeu que esse ano, mês não e outro também, eu vou entrar no sorteio de pagamentos possíveis e inesperados.
Agora a coisa engrena!
Fiquei tão feliz com a quantidade de trabalho, e as infinitas atividades com a equipe, que resolvi chamar o Paulo Briguet para tomar uma na Toca do Bode.
Entre uma Brahma e outra, e uma beliscadinha na azeitona, o Briguet me fez uma proposta:
_ Motora, a juventude está perdida. Os meninos da redação agora resolveram fazer um tal de visagismo. Pagam uma nota pra cortar o cabelo e fazer a barba de um jeito que pareça bonito no Instagram.
_ Pô, Paulo. A gente também já foi jovem, mas a gente era duro. Sem dinheiro, a capacidade juvenil de merda diminui bastante...
Mas o Paulo tem sempre uma visão mais longa e o corte de cabelo da rapaziada era só o intróito:
_ Pois é, pois é... mas isso serviu para me alertar de uma coisa, continuou o Briguet, eu também não sou mais aquele rapazola e preciso me cuidar um pouco nesse novo ano. Imagina se a Rô percebe que o jovem duro que ela conheceu, virou um senhor de nervos de aço e pernas de gelatina. Não dá, não dá... Eu vou começar a ir na academia, Motora, mas você vai comigo!
Eu que não desço nem escada pra evitar a fadiga, me vi numa sinuca de bico. Como dizer não àquele amigo que, desde sempre, me acompanha nas crônicas e nos remelexos da vida?
_ Olha, Paulo, eu agradeço e tudo mais, mas pra mim não dá. Eu não tenho nem o dinheiro...
_ Sem mais nem meio mais, Motora! Eu te empresto um trocado para a mensalidade, e você não vai receber de graça também. Você vai comigo para me ajudar. Enquanto você treina tríceps, eu forço na rosca direta. Seremos a dupla dinâmica. Você na frente e o Paulo atrás!
Aí eu fiquei rendido. Que coração esse Paulo tem!
Deus abençoe o exercício físico do Briguet!
Agora é encontrar um personal e comprar aquele pózinho de malhação que o Renato Cariani vende.
Bom, chega de conversa!
Coloque seu cinto e endureça essa coluna. A nossa corrida vai começar!
Tempo houve em que a panfletagem anticristã era feita por Voltaire, Diderot e companhia. Não que eles fossem gênios da sabedoria humana, mas pelo menos quando mentiam eles disfarçavam um pouco. Com novos dados liberados pelo IBGE em mãos, alguém na redação pensou: "Agora eu se consagro". Apesar de ser só boboca, a manchete acima não é só anticristã, ela é anti-razão. Talvez o jornalista possa pensar, não sei como, que há mais doentes e analfabetos do que pessoas sadias e letradas no país. Se cavar mais a fundo, o jornalista vai descobrir que também existem mais casas do que escolas e hospitais. Provavelmente existem mais lojas também, ou postos de gasolina, ou pet shops. Mas falar mal dos pets é crime, melhor mesmo é insinuar que faltam hospitais e escolas enquanto sobram templos. Com um jornalismo desse, a gente só aguenta rezando...
E já que falamos em fé, chegou a hora de mostrar um milagre. Depois de alguns milhares presos injustamente e de algumas buscas e apreensão na casa dos Bolsonaro, a imprensa abraçou a fé do governo e proclamou sua confissão: os milico são tudo santo, os milico ajuda nóis. Verdade seja dita, a esquerda nunca pôde reclamar do exército de Caxias, que teve seu nome gravado na história pelo glorioso Sargento Pincel. Perfilados e com o soldo na mão, eles são os primeiros a salvar o próprio rabo na suruba política. Mas esse elogio rasgado da Fôia é coisa que eu nunca esperei ver assim, às claras. Assim como a gloriosa Tcheká, ou o exército chinês, nossos heróis da sobrevivência democrática prestarão sempre o grande serviço de cercar velhinhas, idealistas políticos e famílias acampadas. Tudo em nome do regime que convir.
Se há dois anos alguém comparasse a COVID a uma gripe, era fuzilamento. Mas hoje, contando com o esquecimento, a mídia vem dizer que veja bem, as coisas não são bem assim. Meses em casa, máscara até pra ir na esquina e 49 doses de vacina depois, finalmente parece que um "resfriado longo" pode mesmo se parecer com o vírus chinês. Eu só não sei como contar para aquela tia que até hoje usa máscara, ou o filho único do vizinho que ainda vai na escola com uma N95 na cara. Que fria...
Entre as bolinhas de queijo e as piadinhas do tio da Sukita, as festas infantis são o imaginário mais inocente que a gente pode ter. Mas a imprensa, e seus colunistas descolados, querem mesmo é que a festinha virasse uma redação. Mas, convenhamos, para quem costuma defender o aborto e a pauta de gênero infantil, as festinhas familiares devem ser um porre. Eu aqui nem me preocupo, continuo defendendo a bala de côco embrulhada em papel e o brigadeiro como patrimônios nacionais.
Já dizia George Negro Orwell: os negros são iguais, mas alguns são mais iguais que os outros. Além do ato falho de relacionar racismo e uma historinha moderna de sadomasoquismo entre brancos, a manchete levanta o problema: que raios é colorismo? Afinal, se o racismo relativo existe, existe algum racismo absoluto? Aquele racismo claro, de fato, que segrega brancos, japoneses, negros e pardos? Se eu começar a perguntar demais vão dizer que estou sendo relativamente racista. O que eu nego em absoluto! É que a imprensa, quando vista a olhos nús, faz a coisa ficar preta.
É como diz o ditado: em terra de cego, quem tem um olho é rei. E no Brasil, quem tem pele escura é negro, mas talvez sabe-se lá, pode até não ser.
Eu tô é fora dessa discussão, porque, no Cabaré da Rose, a cor da pele é o que menos importa.
Você chegou ao seu destino!
_ Motorista do Uber, com a conta bancária em 50 tons de vermelho.
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