A GUERRA DO MEC

WEINTRAUB NA COVA DAS HIENAS

Paulo Briguet · 5 de Fevereiro de 2020 às 18:41 ·
Grupo de parlamentares esquerdistas pede o impeachment do ministro da Educação por “falta de decoro”. O BSM sabe por quê — e você também vai saber

Há poucos dias, quando juntamente com Silvio Grimaldo fui entrevistar o ministro Abraham Weintraub, em Brasília, eu disse pouco depois de cumprimentá-lo:

— Ministro, diante de tudo que está acontecendo, o sr. poderia dizer, como Camões, “estou em paz com a minha guerra”?

Weintraub sorriu e recitou:

Põe-me onde se use toda a feridade, Entre leões e tigres, e verei Se neles achar posso a piedade Que entre peitos humanos não achei.

Os versos citados fazem parte do episódio de Inês de Castro, no Canto III de “Os Lusíadas”, obra-prima da língua portuguesa. E, de fato, Weintraub não parece estar encontrando muita piedade entre a fauna política de Brasília. O motivo para tanta ferocidade — ou “feridade”, para respeitarmos a métrica do poeta — é evidente: Abraham Weintraub é o único ministro da Esplanada que enfrenta simultaneamente, e sem a menor hesitação, os três grandes grupos políticos que tentam desestabilizar o governo Bolsonaro, a saber: a esquerda totalitária; os globalistas de titio Soros e titio Lemann; e os velhos vigaristas do estamento burocrático brasileiro. Traduzindo em termos zoológicos: só o Weintraub peita as hienas, os tubarões e as capivaras ao mesmo tempo.

Uma parte dessa fauna, cujo habitat é o Congresso Nacional, atravessaria hoje (5) a Praça dos Três Poderes, dirigindo-se, em marche-marche, ao prédio do Supremo Tribunal Federal, com o fito de depositar, sobre a mesa do presidente do STF, Dias Toffoli, um pedido de impeachment contra o ministro da Educação por “quebra de decoro”.

Uma passada de olhos sobre os 19 signatários do pedido basta, ao leitor bem atento, para identificar de quem é o decoro que está sendo quebrado por Weintraub. Eis seus nomes e partidos: Felipe Rigoni (PSB), Tabata Amaral (PDT), João Campos (Republicanos), Raul Henry (MDB), Reginaldo Lopes (PT), Professor Israel (PV), Aliel Machado (Rede), Rodrigo Agostinho (PSB), Marcelo Calero (Cidadania), Maria do Rosário (PT), Perpétua Almeida (PCdoB), Margarida Salomão (PT), Danilo Cabral (PSB), Rafael Motta (PSB), Joênia Wapichana (Rede) , Fabiano Tolentino (Cidadania) e Alexandre Frota (PSDB) e pelos senadores Alessandro Vieira (PPS) e Fabiano Contarato (Rede).

Como se vê, o grupo é majoritariamente representativo das hienas da esquerda (embora também conte com uma ilustre representante dos tubarões globalistas; deixo ao leitor a tarefa de identificá-la).

A denúncia foi fundamentada na Lei do Impeachment (Lei nº 1.079/50) e apresenta dez exemplos de atos incompatíveis com o decoro, a dignidade e a honra do cargo, além de condutas contrárias a princípios citados no artigo 37 da Constituição Federal, como os da impessoalidade, eficiência e transparência.

O texto se apoia em trechos do relatório produzido pela Comissão Externa de Acompanhamento do MEC, presidida pela deputada federal Tabata Amaral e sob relatoria do deputado federal Felipe Rigoni. 

Entre os argumentos que justificam a “eloquente ineficiência do ministro” estão: a ausência de políticas de alfabetização (!!!); as falhas do Enem; o favorecimento de apoiadores do Governo; ofensas às mães de diferentes cidadãos; e a omissão quanto ao uso de R$ 1 bilhão resgatados pela Lava Jato.

É muito interessante que esse pedido de impeachment esteja sendo entregue justamente agora. Parece até algo providencial! O ataque das hienas ocorre no momento que o BSM está prestes a veicular a sua entrevista exclusiva sobre o ministro da Educação, em que ele fala sobre as acusações mencionadas e reduz a pó de traque as bombas constantemente enviadas contra o seu gabinete.

Leitores sem medo, aguardem só mais um pouquinho. Vai ser muito divertido.

 

E nem o ENEM

Em relação ao “desastre anunciado do ENEM”, seria interessante fazer, desde já, uma breve comparação entre o exame de 2019 e os dos anos anteriores, levando em conta o quesito provas reaplicadas, ou seja, o número de exames que tiveram de ser refeitos por conta de algum problema: 

Histórico de reaplicações

Ano Inscritos Presentes
2015 5.360 3.983
2016* 4.125* 522
2017 3.889 1.101
2018 2.726 1.137
2019 150 99
*Reaplicação adicional em 2016 em função do movimento de ocupação de escolas que seriam locais de aplicação do Enem: 273.529 reaplicações.

Em relação ao suposto “desastre anunciado do ENEM” em 2019, segue um histórico dos desastres que não foram anunciados por ninguém, muito menos pela grande mídia, naqueles anos em que ministros, digamos assim, mais decorosos estavam à frente do MEC. Os dados são do próprio Ministério:

2009 | Prova roubada + exame cancelado + questões anuladas + divulgação de gabarito errado Prova cancelada pelo MEC, na madrugada de 1/10/2009, após a divulgação de que havia sido furtada de uma gráfica em São Paulo e oferecida a uma repórter do jornal "O Estado de S. Paulo." Com o vazamento o MEC cancelou e remarcou o Enem, refeito em dois meses depois do prazo original para a aplicação. Parte das universidades que usariam o resultado nos processos seletivos desistiram de contar com a nota e os envolvidos no vazamento foram indiciados. Devido aos problemas, a abstenção na prova chegou a 1,5 milhão de pessoas. Além disso, o Enem 2009 teve anulação de questões e a divulgação de um gabarito errado.

2010 | Erro de impressão + questão anulada O caderno amarelo, com as provas de ciências humanas e ciências da natureza, apresentou perguntas repetidas, fora da sequência e até algumas questões de um outro modelo aplicado, a prova branca. Na folha de respostas, os cabeçalhos que indicaram as áreas de conhecimento estavam invertidos, na comparação com o caderno de questões. MEC orientou seguir a ordem numérica das questões, mas alguns alunos afirmam que não receberam a recomendação e, por isso, preencheram o gabarito de forma invertida. Por isso, 9.500 estudantes foram convidados a fazer a nova prova, mas a maioria faltou, com uma abstenção superior aos 50%. Para resolver a questão dos gabaritos, o MEC abriu espaço para que os estudantes solicitassem a correção de forma invertida.

2011 | 14 questões repetidas e anuladas para estudantes do Colégio Christus, de Fortaleza Após a aplicação do Enem, alunos do colégio Christus, de Fortaleza, afirmaram ter recebido um material contendo 14 questões idênticas ou parecidas com as que haviam caído no exame. A escola havia recebido um dos pré-testes do Inep para calibrar as questões, e um professor furtou questões e as inseriu no banco de itens do colégio. Ele acabou sendo inocentado na Justiça Federal, em decisão de segunda instância. Os alunos da instituição tiveram as questões “vazadas” anuladas e eliminadas de seus cálculos de proficiência final.

2012 | Questionamentos das notas da redação Com a assinatura de termo de ajuste de conduta com o Ministério Público Federal, o Inep divulgou, 60 dias após a divulgação das notas dos participantes, o espelho da prova de redação, uma reprodução digitalizada da redação. Pela primeira vez os participantes puderam comprovar a inserção de trechos que fugiam ao tema proposto. Um estudante incluiu parte do hino oficial do Palmeiras, e outro uma receita de miojo no meio da introdução e conclusão da redação. Ambos tiraram nota baixa por fuga ao tema, mas, até então, o edital do Enem não previa nota zero para redações com deboche. A partir desse ano, a regra mudou.

2013 | Falhas no sistema de inscrição + descoberta de quadrilha e fraude Internautas relataram uma falha no sistema, que informava que as inscrições para o exame estavam encerradas. O MEC confirmou um erro pontual na inserção indevida da frase na tela de entrada da inscrição para o Enem no início da madrugada, mas que em nenhum momento as inscrições foram encerradas. Um esquema milionário de fraude descoberto pela Polícia Civil de Minas Gerais colocou a segurança e a lisura do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). Uma quadrilha especializada em fraudar vestibulares de medicina em faculdades particulares mineiras e do Rio de Janeiro repassava os gabaritos por meio de ponto eletrônico.

2014 | Vazamento do tema de redação Uma foto da página da prova do segundo dia do Enem, que continha o tema e os textos de apoio da redação, vazou pelo WhatsApp pelo menos uma hora e 13 minutos antes do início do exame. Naquele ano, o tema foi "Publicidade infantil no Brasil". Estudante do Piauí denunciou o vazamento, pelas redes sociais, e depois oficialmente à Polícia Federal. Estudantes do Ceará também confirmaram terem visto o tema pouco antes de o Enem começar. A PF confirmou a veracidade da foto, mas, em fevereiro do ano seguinte, o Ministério Público Federal do Ceará arquivou o caso, por entender que não foi comprovada má-fé e que nenhuma das pessoas que receberam a prova tiveram como usar a informação em seu benefício, ferindo a isonomia do exame. 2015 | Questão polêmica

Uma frase de Simone de Beauvoir foi usada como plano de fundo para uma questão que buscava saber as características de determinado movimento social surgido na década de 1960. O trecho do livro “O Segundo Sexo” destacou a autora feminista aos olhos brasileiros e causou divergência nas opiniões. Em meio à revolta, o verbete da filósofa na página wikipédia foi invadido e alterado, classificando-a como “nazista” e “pedófila”. 

2016 | Ocupações das escolas + três aplicações + casos de fraude identificados + questão anulada (reaplicação)

O Inep precisou fazer uma terceira aplicação do Enem (todos os anos tem a aplicação regular e a reaplicação/Enem PPL) para 271 mil participantes afetados por locais de prova com ocupações estudantis. A Polícia Federal prendeu duas pessoas flagradas com materiais de apoio para produzir uma redação sobre o tema cobrado. Um dos participantes, preso em Fortaleza, já tinha acesso ao gabarito e ao tema da redação por volta das 11h e 11h30 do dia da prova (12h e 12h30 no horário de Brasília). Em Macapá, um homem de 31 anos foi preso logo depois de deixar o local de prova. Foi encontrado com ele um texto com o assunto "intolerância religiosa", mesmo tema da redação aplicada naquele ano. Na segunda aplicação, uma questão de ciências da natureza foi anulada por incluir um gráfico que possibilitaria mais de uma interpretação. 

2017 | Dificuldade para obtenção da isenção Diferentes mudanças foram implementadas, como a aplicação em dois domingos consecutivos, com redação no primeiro dia, personalização dos cadernos de questões, a suspensão da certificação do ensino médio pelo Enem. Novos critérios de concessão da isenção da taxa de inscrição levaram muitos participantes de baixa renda se sentiram prejudicados. Muitos criticaram inclusive o sistema de inscrição, alegando dificuldades de entendimento sobre as diferenças dos dois tipos de carência, o que para alguns representou uma indução ao erro já que depois de assinalar a opção errada, não foi possível alterá-la e solicitar a gratuidade novamente, tendo como única alternativa o pagamento do valor de R$ 82.

2018 | Questão sobre dialeto pajubá + questão anulada

Questão da prova de linguagens citava dialeto pajubá, adotado pela comunidade travesti, levando o recém-eleito presidente Bolsonaro a dizer que fiscalizaria a prova. Outra questão tinha o conto “Vó, a senhora é lésbica?”. Professores identificaram que uma pergunta da prova, já tinha sido usada no vestibular da UFPR, em 2013. A questão foi anulada e o MEC anunciou a instauração de processos administrativo, cível e/ou criminal. A questão foi elaborada em 2012 para o Inep, por um professor que, à época, estava vinculado à UFPR. Duas regras foram quebradas: a do ineditismo e a que obriga professores contratados Inep a manterem sob sigilo todas as perguntas formuladas para o Enem. Ampliação do prazo para solicitação de isenção, novidade da edição.

Na entrevista ao BSM, o ministro Abraham Weintraub vai falar sobre os problemas ocorridos com a correção de 2019, que afetaram 0,15% dos candidatos e, graças a uma ação rápida e eficiente do Inep, não resultaram em prejuízo para nenhum candidato.

Vocês não perdem por esperar.

— Paulo Briguet é editor-chefe do BSM, gosta de Camões, não fala pajubá e, graças a Deus, nunca foi assessor do MEC.

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