STF decide que terras produtivas poderão ser desapropriadas

O ministro relator, Edson Fachin, destacou que a legitimidade da propriedade é conferida pelo seu uso socialmente adequado
O Supremo Tribunal Federal (STF) deliberou de maneira unânime a validação de dispositivos da Lei da Reforma Agrária que permitem a desapropriação de terras produtivas que não estão cumprindo sua função social. A ação contestando essa norma foi apresentada pela Confederação Nacional da Agricultura (CNA) e foi julgada no plenário virtual.
A Confederação Nacional da Agricultura argumentou que é impossível exigir ambos os requisitos, seja para definir uma propriedade como produtiva ou para caracterizar o cumprimento da função social. Também ressaltou que permitir a desapropriação de terras produtivas que não cumprem a função social as coloca em pé de igualdade com propriedades improdutivas.
O ministro relator, Edson Fachin, destacou que a legitimidade da propriedade é conferida pelo seu uso socialmente adequado. Em seu voto, que foi seguido pelos demais ministros, ele enfatizou que a Constituição exige de maneira clara o cumprimento simultâneo da função social para que a propriedade produtiva seja considerada inexpropriável.
O ministro também ressaltou que o descumprimento da função social não resulta na expropriação forçada do bem, mas sim na desapropriação, que tem como objetivo indenizar o proprietário pela perda. A Constituição estabelece que a função social é cumprida quando a propriedade rural atende a quatro requisitos simultaneamente: aproveitamento racional e adequado, utilização adequada dos recursos naturais, cumprimento da legislação trabalhista e exploração que promova o bem-estar dos proprietários e trabalhadores.
Entenda
Conforme previsto no art. 186 da Constituição Federal de 1988, as propriedades rurais, para cumpram suas funções sociais, devem abranger alguns requisitos. Veja-se:
Art. 186. A função social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos:
I - aproveitamento racional e adequado;
II - utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente;
III - observância das disposições que regulam as relações de trabalho;
IV - exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores.
Ainda, o ministro relator ressaltou que há uma diferença entre expropriação e desapropriação da propriedade, sendo aquela a retirada forçada do bem, enquanto esta prevê a indenização ao proprietário pela perda do imóvel, conforme também previsto no texto constitucional:
Art. 184. Compete à União desapropriar por interesse social, para fins de reforma agrária, o imóvel rural que não esteja cumprindo sua função social, mediante prévia e justa indenização em títulos da dívida agrária, com cláusula de preservação do valor real, resgatáveis no prazo de até vinte anos, a partir do segundo ano de sua emissão, e cuja utilização será definida em lei.
§ 1º As benfeitorias úteis e necessárias serão indenizadas em dinheiro.
[...]
Apesar do recente entendimento firmado pela Corte, a carta constitucional (pela qual deveriam zelar) é clara sobre a ilegalidade da desapropriação de propriedades produtivas. Em que pese haja a previsão, no art. 184 da CF/88, da competência da União de desapropriar imóveis rurais que não cumprar sua função social, o artigo seguinte dispõe, sem margem para interpretações, que:
Art. 185. São insuscetíveis de desapropriação para fins de reforma agrária:
I - a pequena e média propriedade rural, assim definida em lei, desde que seu proprietário não possua outra;
II - a propriedade produtiva.
Parágrafo único. A lei garantirá tratamento especial à propriedade produtiva e fixará normas para o cumprimento dos requisitos relativos a sua função social.
Ou seja, se em um dispositivo da Constituição Federal há a previsão de desapropriação somente dos imóveis que não cumpram sua função social e no dispositivo seguinte há a proibição da desapropriação de propriedades produtivas, é evidente que as propriedades produtivas, mesmo que não cumpram a dita "função social", deveriam ser consideradas insuscetíveis de desapropriação. Ainda, o raciocínio se comprova pela redação do parágrafo único do referido artigo, que dispõe sobre o tratamento especial à propriedade produtiva e fixação de normas diferentes das aplicadas às propriedades improdutivas, para o cumprimento da função social.
O entendimento do STF, no entanto, foi contrário a isso.
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