TEMPOS DE VÍRUS

O Mito da Quarentena e a Realidade da Caverna

Evandro Pontes · 17 de Abril de 2020 às 15:50 ·

Prenda um guerreiro e transforme-o num covarde: eis o segredo dessa quarentena dos infernos

uando do início desta quarentena, algum Plato feelings me inspirou a escrever sobre o fenômeno à luz (perdão pelo trocadilho, Briguet!) do Mito da Caverna de Platão.

Logo me desanimei e uma enorme preguiça tomou conta do meu humor, justamente por conta de um detalhe que está escrito no próprio diálogo platônico: o eco da parede oposta (hekho tó desmotérion ek tou katantikru ekhoi, Rep. VII, I, b, 7) – ou em modernês, falar para portas.

Encorajado pelos amigos Jefferson Araújo e Maurício Bunazar, tomei consciência que julgar o mundo pelas portas fechadas seria fazer tabula rasa das almas livres e é a elas que eu me dirijo, neste diálogo, para tratar dessa merda de quarentena em uma perspectiva um pouco mais provocativa.

A consciência de si a respeito do estado em que fomos metidos nessa quarentena, de modo amplo e geral, é próxima do zero. No grosso caldo a maioria da população mundial não tem noção do inferno em que está sendo metida.

E digo aqui Inferno pois o Mito da Caverna trata de uma caverna subterrânea [habitável] (katageión [oikhesei] spelaiodei, Rep. VII, I, a, 3).

No Mito da Caverna, Sócrates, ao propor o exercício a Glauco, parte do pressuposto que todos os habitantes da caverna (que o próprio Sócrates trata como prisão, assim como o faz na passagem citada acima em VII, I, b, 7 ao tratar a “caverna” pelo nome de demotérion e não de speláion) lá estão confinados desde a tenra infância: qual seja, aquela prisão é tudo o que eles conhecem em sua vida inteira.

Mais – a única coisa que conhecem vinda do exterior é um reflexo de luz cuja origem desconhecem: Fós. Eis o segredo do debate, pois a palavra Fós (FώV ou Φϖς dando Faós, Φάος neste último caso quando do koiné, grego tardio, para diferenciar os dois sentidos) significa primariamente luz, mas em um sentido mais distante significa também o próprio homem, sobretudo o guerreiro.

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