CRIME OU NARRATIVA?

O infeliz agressor de Feliz

Paulo Briguet · 18 de Março de 2023 às 14:00

Suposta ameaça a militantes feministas perturba a tranquilidade de uma pequena cidade gaúcha



Era uma vez uma cidade chamada Feliz. Em 1846, alguns imigrantes alemães vindos da região de Hunsrück navegavam pelas águas do Rio Caí quando encontraram uma clareira, onde resolveram desembarcar. O líder do grupo teria dito aos seus companheiros:

— Hier sind wir glücklich. (Aqui estamos felizes.)

Assim foi batizada a pequena cidade do Vale do Caí, no Nordeste do Rio Grande do Sul. Hoje Feliz tem 13 mil habitantes, um IDH de 0,839 (considerado muito alto) e uma economia baseada na agricultura e na indústria de ferramentas agrícolas. Destacam-se a produção de morangos e fábricas como a Hidrojet, a maior empresa do município, com 240 funcionários. Em 2008, foi criado no município um Núcleo Avançado do IFSul (Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Sul-Rio-Grandense de Feliz), que hoje oferece cursos técnicos e superiores nas áreas de Química, Engenharia Química, Meio Ambiente, Português, Processos Gerenciais, Desenvolvimento de Sistemas, Gestão Escolar e Gestão Empresarial. Mais de 90% do corpo docente do Campus Feliz é composto por mestres e doutores; a unidade tem 1.100 alunos.

Um dos símbolos de Feliz é a Ponte de Ferro, construída em 1900, que permitiu o desenvolvimento econômico da região, fazendo a ligação com a capital gaúcha e outras regiões do Estado. Como a maioria da população (cerca de 80%) tem origem alemã, há eventos e instituições ligados à cultura germânica, como o Grupo de Danças Folclóricas Alemãs de Feliz, o Festival Nacional do Chope e a festa Dança e Chope!. Também merece destaque a Fenamor — Festa da Amora, Morango e Chantilly, realizada anualmente no mês de novembro.

Feliz faz jus ao nome. Ou fazia, pelo menos até o último dia 10.

Naquela sexta-feira aconteceu algo que aparentemente perturbou um pouco essa felicidade. Duas professoras e uma estudante do Campus Feliz estavam na praça central da cidade, onde colocavam faixas e cartazes alusivos ao Dia Internacional da Mulher, quando delas se aproximou um homem vestido de preto e começou a “proferir palavras de ódio”. Segundo elas, o homem teria dito:

— Morrem poucas mulheres. É preciso morrer mais, principalmente as comunistas como vocês.

Imediatamente as mulheres registraram um boletim de ocorrência na delegacia local. Nenhuma delas conseguiu fazer imagens do homem ou gravar as ameaças; mas, de qualquer maneira, a mídia deu bastante destaque à denúncia. A polícia informa que já tem imagens de um suspeito, obtidas por câmeras de segurança, mas ainda não identificou o agressor.

Uma das matérias publicadas pela mídia local abria com um texto feminista exposto na Praça Municipal de Feliz:

“Sou mulher e preciso dizer: diariamente, nós mulheres somos submetidas a inúmeras situações que nos amedrontam, vigilam, calam e, na pior das situações, nos fazem vítimas fatais. Não é possível ignorar e negar tais realidades. É preciso falar sobre o que nos incomoda, isola e não nos deixa que sejamos quem realmente quisermos”.

A direção do Campus Feliz se manifestou oficialmente sobre o caso:   

“Nossa instituição, juntamente com as vítimas, está tomando as providências necessárias junto às autoridades policiais competentes. Um boletim de ocorrência foi registrado e o ocorrido será investigado pela polícia. Internamente, o campus está prestando apoio psicológico às servidoras e à aluna, bem como orientando a comunidade acadêmica sobre o tema da violência contra a mulher, na expectativa de que, no futuro, situações de agressão como essa não se repitam”.

Um grupo de alunos do IFSul fez um protesto em frente à instituição, portando cartazes com mensagens feministas, tais como “Ameaças de morte não nos calarão”.

Um jornalista e empresário da região carregou nas tintas em sua rede social:

“Voltando para agradecer a mobilização de toda a galera que possibilitou a gente romper a bolha local e denunciar esse ato de violência. @tombelmonte68 , tu é o cara!! Valeu pela força junto à turma de NH. Agora é esperar que a prefeitura @feliz.rs se mobilize em relação ao tema, pois até o momento não demonstrou nenhum tipo de solidariedade para com as vítimas. Uma vergonha!! @policia_civil_rs está em busca do agressor. É preciso seguir a mobilização para que isso vá adiante e não caia no esquecimento. Lugar de fascista agressor de mulher é na cadeia”.

Uma cidadã de Feliz, que prefere permanecer anônima, lamenta que o suposto agressor ainda não tenha sido identificado. “Enquanto não soubermos quem é esse homem, não saberemos efetivamente o que ele disse. Por enquanto, só temos a versão das feministas.”

Como se sabe, a militância esquerdista tem um conceito muito amplo sobre “discurso de ódio” — no qual geralmente inclui todas as opiniões que desagradam à própria esquerda. Por isso, é preciso encontrar o infeliz agressor de Feliz e ouvir o outro lado da história.

 


"Por apenas R$ 29/mês você acessa o conteúdo exclusivo do Brasil Sem Medo e financia o jornalismo sério, independente e alinhado com os seus valores. Torne-se membro assinante agora mesmo!"