MERCADOS INTERNACIONAIS

O abismo da Argentina e o horizonte para o Brasil

Lucas Ribeiro · 1 de Maio de 2020 às 11:00 ·

Governo esquerdista argentino congela negociações no Mercosul, dando ao Brasil a chance de seguir um caminho distinto ─ e promissor

Na última sexta feira, no dia 24 de abril, a Argentina anunciou sua decisão de congelar as negociações entre o Mercosul e os acordos de livres comércio com países como Coreia do Sul, Singapura, Líbano, Canadá e Índia. As justificativas são o “combate à pandemia” e a “proteção às empresas, ao emprego e às famílias mais humildes”. Os acordos com a União Europeia e a EFTA seguirão em curso. A nota da chancelaria argentina ainda cita que existe uma previsão de 32% de queda no comércio mundial, segundo organismos internacionais.

O congelamento da Argentina apenas reforça um entendimento de economia internacional do governo peronista-socialista de que o livre comércio é negativo. Esse é o pensamento baseado na tradição cepalina que mistura ideias protecionistas, marxistas e keynesianas da forma de pensar o comércio internacional num jogo de soma zero e entende as relações com os países desenvolvidos como ameaçador sob a justificativa de risco de destruição da indústria nacional e submissão ao capital internacional. O resultado é uma política econômica que faz lembrar os piores momentos de Sarney e Dilma no Brasil.

A visão contrasta com a visão mais favorável à globalização, ao livre comércio e à integração nas cadeias produtivas globais defendidos pelo governo Bolsonaro, a chancelaria de Ernesto Araújo, e os atuais governos do Paraguai e Uruguai. Ainda que o ministro Araújo faça duras críticas ao globalismo (supremacia de um poder político global sobre os estados soberanos e a imposição de suas agendas), ele é amplamente favorável à globalização (maior integração econômica nas cadeias produtivas globais). Quem quiser entender mais sobre a diferença entre globalismo e globalização pode assistir à palestra sobre o tema proferida pelo atual assessor da Presidência para assuntos internacionais, Filipe G. Martins.

É importante lembrar que a defesa de um livre comércio do governo Bolsonaro não é submissão a uma cartilha liberal ideológica. A posição é de que a abertura do Brasil deve ser acompanhada da abertura do outro país, e que a negociação bilateral é um elemento fundamental na formatação desses acordos bilaterais. Não se pode pensar, por exemplo, que a negociação com Singapura ─ 5 milhões de habitantes, uma população extremamente rica, expertise em mercados financeiros e logísticas das mais avançadas do mundo ─ seria a mesma de um acordo com a Índia ─ que tem 1,3 bilhão, um PIB elevado pela quantidade de pessoas, mas baixo em renda per capita.
 
Novos temas que estão impactando o comércio internacional, além dos tradicionais temas de tarifas e subsídios. Há grandes oportunidades no debate de harmonização tributária entre os países, concertação de uma série de regulamentações, regras para investimentos e a possibilidade de compras governamentais que possuem um papel cada vez mais importante nas relações econômicas internacionais.
 
O Brasil deveria apostar numa liberação gradual, negociada e bilateral, feita país a país. De acordo com os possíveis ganhos de cada país e sem fórmulas pré-concebidas. E sem deixar de considerar aspectos geopolíticos mais amplos. Uma busca de novos mercados, mas não a qualquer custo; uma visão de mais liberdade e abertura, ao passo que se considera o papel de cada ator no cenário internacional. 

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