COVID-19

As cobaias israelenses da vacina

Ricardo Gancz · 2 de Fevereiro de 2021 às 14:46 ·

Entenda como o governo de Israel está fazendo de seu país um grande campo de testes para a vacina da Pfizer, com consequências imprevisíveis
 

Israel passou da marca de 2 milhões de pessoas que receberam a primeira dose da vacina da Pfizer. Mais de um quarto dos israelenses já receberam a primeira dose da vacina e a estimativa do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu é de que até o final de março toda a população maior de 16 anos poderá se vacinar. Os números chamam bastante atenção pela agilidade na mobilização e especialmente por Israel ter recebido inicialmente mais vacinas do que o Reino Unido e Estados Unidos. Mais ainda, em momento em que diversos países estão brigando para conseguir a vacina, Benjamin Netanyahu está cantando vitória por ter conseguido um acordo com os laboratórios que garantirá essa vacinação em prazo recorde.

O uso político de tal acordo é óbvio. O país já está no terceiro confinamento obrigatório no qual as pessoas perderam o direito de ir e vir, precisam andar com uma focinheira na cara, crianças estão sem escolas e muita gente perdeu o emprego. Israel terá eleições no dia 23 de março e situação do vírus chinês certamente influenciará os eleitores. Se, por um lado, as pessoas estão extremamente insatisfeitas com a situação dos confinamentos, elas estão bastante esperançosas de que depois da vacinação haverá uma volta ao normal.

O anúncio de Netanyahu está sendo percebido por parte do eleitorado da seguinte forma: os confinamentos podem ter sido um remédio amargo ou até mesmo um erro da parte de Netanyahu, mas ele lutou por todos e foi hábil o bastante para nos conseguir uma solução que chegará ao país antes de qualquer outro. Isso se refletiu também nas pesquisas: o Likud, partido de Netanyahu, chegou a ter uma previsão de 25 cadeiras mês passado, e a última pesquisa está dando ao Likud 32 cadeiras. Não importa tanto se a vacina não garantirá de fato o retorno à normalidade. As pessoas acreditam que isso acontecerá e, de todo modo, as eleições serão antes do término da vacinação. O uso político, portanto, é óbvio.

O uso político da vacinação, porém, não é exclusividade de Israel. Antes de fazer acordos com Israel, a Pfizer tinha em mãos o poder de escolher a quem beneficiar. O que poderia tê-los levado a beneficiar Netanyahu?

Os próprios laboratórios admitem que os dados que eles têm oriundos dos testes são bastante limitados e não foram capazes de dar as informações mais valiosas sobre a vacina: grau de efetividade em função de cada grupo, em particular nos grupos de risco; grau de efetividade na prevenção de casos graves ou que levem a morte; efeitos colaterais. Israel é, talvez, o melhor local no mundo para fazer coletar dados de modo a tentar responder essas perguntas...

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