DIÁRIO DE UM CRONISTA

A multidão da praça vazia

Paulo Briguet · 30 de Março de 2020 às 14:46 ·

Todos eles estavam ali: os abortados, os fuzilados, os silenciados, os humilhados, os envenenados, os torturados, os esfaimados, os massacrados, os enganados...

“A linha que divide o bem do mal passa pelo meio do coração de cada ser humano. E quem está disposto a destruir um pedaço de seu próprio coração?”
(Alexandr Soljenítsin)

A praça não estava vazia; nunca houve uma praça mais cheia do que aquela. Enquanto o velho padre dava a sua bênção, os olhos das vítimas refulgiam na escuridão. Era gente de todas as idades, de todas as cores, de todas as línguas, de todos os cantos do mundo. Mas alguma coisa as unia, e essa coisa era a dor. Irmanadas pelo sofrimento, as vítimas ouviam as palavras e bebiam os silêncios que retumbavam nas pedras da velha praça. A dor era a linguagem comum entre eles, o ar que elas respiravam, o sangue em seus corações. A dor é a sua pátria: eis a multidão da dor, diante do velho padre.

Continue lendo
Já tem uma conta? Faça login


ARTIGOS RELACIONADOS